Base de Caçadores

Descrição: Uma pequena casa isolada, localizada na borda do Lado Frio, que serve de base para Caçadores. Por situar-se na fronteira, o clima é agradável, ao invés de ser congelante como nas áreas centrais do país, ainda que tenha algumas brisas frias. Atualmente, a dupla de Caçadoras Lyanna e Alyssa vivem aqui em conjunto, pois cabe a elas agirem nesta área. A residência, embora seja pequena e de aspecto simples, é mantida num estado impecável por uma de suas donas, que possui certas manias de limpeza. Como seu tamanho sugere, a casa possui apenas um quarto, com duas camas de solteiro, e um banheiro. Há uma pequena sala conectada com a cozinha.

Eu tentava sentar nas zabuton, mas a única coisa que eu conseguia fazer era ficar deitada na mesa baixa, com uma careta no rosto. Em minha mão, estava segurando uma tigelinha com saquê, qualquer pessoa que entrasse na base, não conseguiria passar com tantas garrafas de saquê espalhadas pelo chão; igualmente pela bagunça, chão e paredes estavam molhados pelo saquê. Já estava até imaginando como a Lyanna ficaria se me vesse nesta situação, com certeza, eu estaria perdida; e ainda pelo fato, de ela estar demorando, ela com certeza estaria aprontando no castelo, tenho certa pena pelas aquelas moças que trabalham lá.

O pôr-do-sol estampava o céu, e uma brisa fria passava por mim — embora a temperatura estivesse bem mais agradável aqui, do que no Castelo. Acompanhada de Yuusha, fui me aproximando da pequena casa em que eu e Alyssa moramos.

— Ainda bem que chegamos, pois logo já estará de noite. — Comentei com Yuusha.

O vento remexeu meus cabelos loiros, e passei minha mão neles, arrumando-os. Apontei à casa logo em nossa frente:

— É onde eu moro, junto com minha colega de equipe. Sei que é um lugar pequeno, mas não é como se passássemos muito tempo aqui, mesmo. E não é tão ruim. Ela tem umas manias de limpeza, tudo está sempre arrumado, sabe?

— Oh! Sim... — Caminhava junto de Lyanna enquanto uma leve brisa passava por nós. Apesar de a tristeza não estar muito evidente, ainda sentia certo receio pela morte de minha família. Estava muito confuso sobre eu mesmo e tudo que havia mudado em meu redor. Mas, de uma coisa eu tinha certeza, enquanto tivesse Lyanna ao meu lado, eu não estaria mais sozinho.

— L-Lyanna... O-Obrigado. — Ao mesmo tempo que pronunciava com certa timidez, sentia minhas bochechas corarem. Como não conseguia encara-la corretamente, passei a olhar fixamente para o chão.

— Ora, por que está me agradecendo? — Sorri levemente. — Fui eu quem inventou de arrastá-lo até aqui.

Passei a andar até a porta da casa, e fui abrindo-a. De imediato, reparei num cheiro desconfortante, mas não liguei.

— Alyssa, você está aí...? — E cessei minha fala no instante em que percebi que Alyssa estava jogada sobre a mesa baixa, e a casa toda suja de saquê, juntamente com várias garrafas largadas ao redor. A primeira coisa que fui checar confirmou tudo: ela segurava uma tigelinha, para ingerir a bebida, nas mãos.

E pensar que eu havia a elogiado, dizendo como mantinha a casa limpa; e ela simplesmente embebedou-se e transformou nossa moradia em algo deplorável. De uma expressão tranquila, fui à uma de ódio em instantes. Não se safaria tão fácil depois disso. Fui andando até ela, com passos pesados, deixando minha raiva evidente, porém... Apenas escorreguei no saquê que tornou o piso úmido, e caí de cara no chão.

Levantei completamente encharcada com o saquê. Até mesmo o meu vestido, que eu havia escolhido exclusivamente para ficar apresentável na visita ao castelo, estava molhado. Minha face ficou ainda mais assustadora, e lancei um olhar terrivelmente sombrio em Alyssa.

— ALYSSA, SUA...! — Gritei, falando pausadamente.

Meus punhos cercaram-se com as chamas azuis. Fui caminhando até ela, agarrei pelo braço, e levantei-a com uma única mão. Já a outra, eu cerrava o punho, impulsionando para trás.

— ALYSSA, O QUE VOCÊ PENSA QUE ESTÁ FAZENDO, SUA BÊBADA?! — Berrei.

E acertei-lhe um soco, fazendo-a voar pro chão. Não foi tão forte quanto deveria, mas mesmo assim serviu de lição. Cruzei meus braços, e fiquei encarando-a, para ouvir suas explicações.

Achei estranho o fato de que Alyssa ainda permanecia no chão. Ela pode até ser uma bêbada que sujou toda nossa casa, mas ela é alguém forte, eu admito. Será que eu havia exagerado, e batido forte demais?

— A-Alyssa...? Pode levantar, eu não vou bater em você de novo... — E nada, pois ela continuava imóvel.

Levantei-a segurando pelo braço mais uma vez, e dei um tapa em seu rosto com a outra mão.

— Alyssa, ACORDA!

Eu passei a dar tapas repetidamente até que ela mostrasse algum sinal de estar acordada. Quando isso aconteceu, suspirei aliviada, e coloquei-a de pé, ainda que ela não parecesse tão bem assim. Afinal, só estava desacordada por ter bebido tanto e passado mal. Cruzei os braços novamente, e voltei a encará-la com uma expressão zangada, enquanto as chamas de meus punhos apagavam-se.

Ainda com os braços cruzados, olhei para baixo, e Alyssa implorava por perdão. Bom, agora era tarde, não adiantaria nada continuar irritada com ela.

— O que deu em você...? — Resmunguei.

Descruzei os braços, normalizei minha face, e falei num tom de voz mais calmo:

— Hunf, tudo bem. Enfim, como pôde ver, nós temos visita hoje. Esse é o garoto daqueles boatos, que sobreviveu ao ritual de extração do Cristal, a muito tempo. Eu encontrei ele por acaso no castelo. — Apontei para Yuusha, sugerindo que se apresentasse. — Com licença, eu estou toda suja de saquê. Fiquem aí.

Após dizer isso, me dirigi até o quarto que eu compartilhava com Alyssa, e me surpreendi por não encontrar saquê lá. Fui até o armário escolher alguma outra roupa para vestir, peguei-a, e andei até o banheiro para tomar um banho, e em seguida deixei a roupa em qualquer canto.

— Ly-Lyanna... — Levantava minha mão em direção à ela para que não me deixa-se sozinho ali. Lyanna parecia não ter ouvido. Me sinto completamente envergonhado mas, tento agir da maneira mais normal possível.

— Desculpe pelo incomodo... E-Eu sou o Yuusha... Você quer ajuda para limpar?

Enquanto Alyssa realizava suas ações me sentia um pouco incomodo em vê-la limpando enquanto eu mesmo ficava apenas observando.

— Por favor, deixe-me ajuda-la. — Comecei a recolher todas aquelas garrafas e guarda-las enquanto Alyssa limpava.

Estava andando calmamente pela estrada que fica perto da fronteira do Lado Frio, girando no meu dedo o saquinho de dinheiro que consegui na venda de mais cedo. Um dos manda-chuvas do mercado disse que seus homens haviam visto duas pessoas saindo do castelo e vindo nessa direção. Devo rouba-los, o dinheiro compensaria qualquer derramamento de sangue.
Estava com minha roupa de sempre, especializada, feita de couro e outros materiais. Uma trança loira descia por minha cabeça até um pouco abaixo do meu busto, porém ela estava escondida por meu capuz, não conseguiriam ver minha face a não ser que tirassem o capuz, poderiam me confundir com uma mendiga ou um cara completamente estranho.
Após andar um pouco vi duas pessoas andando em direção a uma pequena cabana, uma garota e um garoto, a menina era pequena e loira. O menino parecia estar com medo ou tímido demais. Ninguém é confiável.
Segui as duas figuras de longe, a garota abriu a porta da cabana e entrou com o garoto. Ao observar por uma das janelas vi que havia outra garota lá dentro, ruiva, que estava caída no chão com vários saquês em volta. Bêbada, com certeza. A loira baixinha estava gritando com ela, o que foi até divertido de se assistir quando a ruiva agarrou o pé da loira.
Andei abaixada até a janela que estava mais próxima do rapaz, abri ela com delicadeza, para que não ouvissem nada e botei meu capuz ainda mais pra frente. Vi que a garota loira havia saída da sala, era a hora perfeita. Peguei uma das minhas adagas e deixei a outra no cinto, caso precisasse, pulei com habilidade, entrei na cabana e puxei o rapaz, que estava indo ajudar a ruiva com a limpeza, posicionando a adaga em seu pescoço, um movimento brusco e eu poderia mata-lo, mas não agora. Olhei para a garota ruiva e fiz uma voz um pouco diferente da minha, para que não conseguisse distinguir se era uma garota ou um rapaz os assaltando.
-Me dê todo seu dinheiro e suas coisas de valor, caso contrario o sangue derramado será inevitável.

OBS: Ta uma bosta, mas eu melhoro com o tempo.

Após terminar de me lavar, me sequei com a toalha, e vesti-me com a roupa que havia pego. Um vestido branco, curto e simples, com detalhes em preto, tendo mangas compridas. Também uma meia-calça desta mesma última cor, que ia até a metade das coxas; e calcei uma sandália qualquer. A roupa que eu vestia antes, agora coberta de saquê, encontrava-se jogada num canto; Alyssa irá lavá-la depois, sem dúvidas.

Penteei meus cabelos molhados e, com a toalha que usei antes, fui secando-os enquanto voltava para a sala. Me surpreendi por encontrar uma outra pessoa lá, e tudo indicava que tratava-se de um ladrão. Este apontava uma adaga para o pescoço de Yuusha, e isso é definitivamente perigoso pra mim. Afinal, esse rapaz é uma fonte de informações muito valiosa, e se ele morrer agora, volto para a estaca zero. Optei por permanecer-me em silêncio. Embora minha presença na sala já estivesse escancarada, se eu dissesse algo, poderia piorar as coisas.

Mesmo estando extremamente apavorado. Sinto que aquela não parecia ser uma pessoa ruim. Afinal, ainda não havia me matado. Pois chances já teve.

— Por favor senhor ladrão... Não poderíamos apenas conversar? Tenho certeza que podemos chegar à um acordo pacificamente... Matar é... Errado... — Senti por um leve instante meu corpo ficar trêmulo. A morte estava bem a minha frente.

A garota loira havia adentrado a sala, ela permaneceu calada, boa escolha. Senti o rapaz tremulo, ele estava apavorado perante minha adaga. Pediu para conversar e decidir pacificamente, como qualquer mimadinho com alguma experiencia com lábia diria numa situação dessas.
-O que você sabe sobre certo e errado, garoto? - Bufei. - Não estou aqui para matar ninguém, a não ser que você não me dê escolha. - Pressionei a adaga um pouco mais forte, não machucou, era apenas para apavora-lo mais ainda. - Agora me diga, seu viado de cabelo oxigenado, o que tens de valioso para entregar-me?-Olhei pra loira e para a ruiva, que me observavam. - Isso serve para vocês também.

A reação de Alyssa me surpreendeu. Ela realmente possui um grande senso de justiça, e isso é até admirável de se ver. Lutar por um garoto que conheceu a alguns minutos é bem a cara dela. O ladrão parecia bem determinado, também. As coisas não iriam acabar bem desta maneira.

— Hunf. — Resmunguei. Voltei a secar meus cabelos com a toalha, aparentando estar completamente indiferente à situação. — Escute. Se você quer matar um garoto por causa de algumas moedas, vá em frente. Mas, se poupá-lo e nos ajudar em algo, você poderá conseguir um prêmio muito melhor. — Sorri de canto.

A ruivinha é um pouco esquentada. Seu senso de justiça me lembra historias antigas, porém não é hora para ser melancólica. A loira quer  propor algo maior do que apenas algumas moedas. Ela pensou bem. Continuei segurando o garoto, mas acabei me apoiando nele, o fazendo de móvel para meu braço e sorri, apesar de ninguém conseguir ver.
-Sabe ruiva? Com um movimento pode ser ele a levar o tiro em meu lugar. - Brinquei com o cabelo branco do rapaz. - Mas não é hora para joguetes. O que você tem em mente, loirinha?

Dei uma pequena risada. Como esperado, o ladrão mostrou interesse em minha oferta. Assim sendo, respondi:

— Creio que já ouviu falar dos Caçadores, não é? Eu sou uma deles, e a "ruiva" também é. — Os Caçadores tinham sua fama. Um grupo temido por sua força, com certeza. — Nós vamos matar o homem chamado Magnus, não importa o que tenhamos que fazer. E, pra isso, preciso do garoto.

Apontei para Yuusha. Continuei a secar meus cabelos loiros, e passei os dedos entre eles, arrumando-os. Parei com o processo, e passei a encarar firmemente o ladrão, com minhas orbes azuis atentas à qualquer movimento.

— Eu quero lhe propor algo. Se você nos ajudar a caçar Magnus, você poderá ficar com alguns dos cristais valiosos dele pra você. Com certeza, valem muito mais do que algumas poucas moedas. — Sorri de canto novamente.

Eu tinha que reconhecer; para entrar em nossa residência com tamanha destreza, e passar despercebido até agir, devia se tratar de alguém muito habilidoso. Além disso, seja quem for, não teve nenhum remorso em apontar uma adaga para o pescoço de um garoto inocente. Pessoas assim são úteis para alcançar um objetivo maior.

Uma oferta tentadora, sim. O rapaz continuava a tremer, temia pela vida. A loira sorria de forma despreocupada, sabia que sua oferta havia chamado minha atenção. Cristais, hein? Os rumores eram sérios, e os Caçadores realmente estão na ativa. Conheço riquinhos que pagariam muito mais do que essa cabana vale por esses cristais, muito mais do que drogas ou objetos cobertos de ouro. Passei um minuto pensando rapidamente, calculando os pros e contras, essa garota parecia falar sério, teríamos um acordo então? Não, muito fácil. Se eu matar o rapaz aqui não teria nenhuma vantagem para mim, além de matar um inocente. Eles não parecem ter muito dinheiro, pelo visto tudo foi gasto em saquê. A oferta está boa demais, porém serão eles fieis na missão? Ou tentarão me matar na primeira oportunidade?
 - Como planejam caça-lo? - Perguntei, observando cada movimento das duas garotas. - E como terei sua palavra que não me matarão? Que não estão me enganando?

— Magnus viaja para vários lugares, onde ele recolhe algumas pessoas para os rituais de extração. Seja discretamente ou não. Se conseguirmos encontrá-lo enquanto isso ocorre, simplesmente o mataremos, e estará acabado. Quando isso acontecer, você poderá pegar uns cristais dele pra você, caso nos ajude. É assim que iremos caçá-lo. — Expliquei.

Ainda que estivesse interessado na oferta, o ladrão não conseguia deixar de duvidar dela, e isso é evidente. Talvez eu estivesse sendo boazinha demais. Naturalmente, apenas diria que se o ladrão matasse o garoto, eu o mataria logo depois. Mas, caçar Magnus não tem sido uma tarefa fácil, e quanto mais ajuda melhor.

— Não vou mentir, caçar Magnus não é algo tão simples quanto parece. — Sorri ironicamente. — Quanto mais ajuda tivermos nisso, melhor. Se nem mesmo o grupo de Caçadores está tendo êxito nisso, você deve imaginar o tamanho do problema. Não posso te garantir nada, mas não tenho motivos para te enganar.

  -É realmente uma boa oferta. - Peguei o rosto do rapaz pelo queixo com um dedo e levantei. - Você é tão valioso assim pra capturar o Magnus?
  Suspirei e soltei o rosto do garoto. O que fazer? Essa questão invadia meus pensamentos, enquanto folgava a adaga no pescoço dele, eu pensava nesses anos que estive no Lado Frio. Se eu conseguir esses cristais nunca mais precisarei me preocupar com dinheiro e poderia até pagar para roubarem por mim. Todo o esforço seria recompensado, não seria uma idiota como meus pais.
  Essas pessoas de primeira vista parecem realmente focadas em sua missão, e com as informações que eu tenho e posso encontrar a chance de achar Magnus aumentaria. Minha mente estava me levando a aceitar a oferta, seria arriscado? Sim, bastante, eu não conheço nenhum deles, não sei se são de confiança, eles poderiam me matar facilmente enquanto eu dormisse. Mas quer saber? Eu penso demais, foda-se os riscos, esses cristais são tudo que eu preciso.
  Retirei a adaga da garganta do mimadinho oxigenado e a guardei, pude ver o alivio em seus olhos. Ajeitei minha luva e estendi minha mão para a loirinha.
   -Sua inteligencia me surpreende, garotinha. Temos um contrato então? Eu te ajudo e recebo os cristais. - Sorri, ninguém poderia ver, porém a oferta me fez sorrir com o dinheiro que virá em minhas mãos sujas. - Apertemos as mãos, apenas para oficializar, não gosto de coisas sem profissionalismo.

Caminhei em direção ao ladrão. Com a mão esquerda eu ainda segurava a toalha, e estendi a direita para apertar a mão dele.

— Temos um contrato. — Sorri levemente.

Logo de imediato, estranhei um pouco. Sua mão era relativamente pequena e delicada para pertencer a um homem. Ignorei isso, já imaginando o porquê, e soltamos as mãos. Voltei a passar a toalha nos cabelos; eram compridos demais e certamente demorariam mais um pouco para secarem. Prossigo com minha fala:

— Presumo que você não tem onde ficar, correto? — Referi-me ao ladrão. — Creio que o único jeito é de ficarmos todos aqui, pois já é noite e não existe nenhuma hospedaria nas proximidades. Por hora, vamos apenas ajeitar esse lugar. — Dei meia volta e dirigi-me ao banheiro, para deixar a toalha de volta lá. Enquanto isso, pronunciei alto para que pudesse ser ouvida na sala. — Ah, Alyssa! Você vai lavar minhas sandálias depois, esse chão ainda está cheio de saquê!